18 novembro 2007

A morte nossa de cada dia


Fui ao meu enterro hoje
Alias...entendi como tenho morrido todos os dias.
Fitei um caixão, com a certeza de que parte de mim estava encerrada,
enterrada pra todo o sempre.

Não falo com tanta tristeza,
mas com toda a impotência que senti ao descer com aquele caixão.
Achava que a vida estava dentro de mim,
mas entendi que esteve em cada interação que vivi.
Achava que a vida estava cercada na ilha que somos, cada um de nós,
e mais uma vez, entendo que está e esteve em cada nós que vivemos a cada dia.

Falta poesia pra expressar esse sentimento,
falta emoção pra exagerar esse pensamento,
falta intensidade pra gravar esse momento.

Não consegui entender meu amigo dentro daquela estante de madeira
não consegui medir a tristeza daquele momento.
No meu egoísmo...só pensei no quanto eu deixei de viver aquela potencialidade,
no quanto eu deixo de trocar, de interagir com pessoas que me dizem.

O que é a vida senão viver?
O que é a morte?

Penso no que eu mesmo tanto digo...
"a vida é o que acontece com você enquanto está ocupado fazendo outros planos" (JLennon)
"mesmo um relógio quebrado está certo duas vezes por dia"

Afinal, não importa aonde estamos ou o que estamos fazendo,
estamos em algum lugar,
estamos em algum momento,
e é nesse preciso momento que a nossa vida está acontecendo.
Portanto, a arte da vida está em fazer desse momento um momento de vida.

Tem tantas pessoas com quem eu poderia viver tanto...
Tenho tantas chances de criar uma vida significativa...
e cada momento não vivido é um momento "morrido"

A vida poderia ser levada à uma nova dimensão.
Uma dimensão de alegria, de troca, de vida.
Gostaria de pedir desculpas a todas as pessoas com quem morri
Gostaria de tentar entender porque eu nao vivi quando eu pude
Gostaria de voltar àquele cemitério pra me resgatar...

Hoje eu entendo que parte importante da minha vida já foi enterrada.
E me surpreendo de não ter tido a dimensão de entender
o quanto de mim era sepultado em cada uma daquelas cerimônias...
partes importantes de uma história que ficaram sem fim
partes de uma potencialidade de troca que agora fogem à minha capacidade de vivenciar.

Me pergunto então o quanto deixei de viver,
o quanto deixei de brincar, de rir, de chorar, de tocar...de trocar.
Minha capacidade de vida está ligada à minha capacidade de interação.
E agora que pessoas se foram, vejo o quanto meu mundo encolheu.

Não meço meus dias pela quantidade de horas
mas pela intensidade das trocas.
Sou tão extenso quanto consigo me dar.
Sou tão intenso quanto consigo tocar.
Sou tão imenso.

O mundo tem medo de si
as pessoas se contraem
Como dizia Wilde, parecem mendigos...esfomeados
Vivas aos que tem coragem, aos que trocam...aos que vivem.
Pois a troca é a única forma de contato, o único meio de entendermos
de sermos, de nos plastificarmos.

A cada vez que volto ao cemitério sinto uma estranha sensação de "casa"
de saber que tanto de mim já foi lá imortalizado...ou finalizado.

Novas portas se abrem a cada dia.
Novas chances de comunicar, de trocar, de viver.
Começo a entender algo que me assusta.
Começo a mudar meu conceito de existência.
Entro em metamorfose.