11 outubro 2005

O Estado é você


Vou andando sem direção
certo que a caminho
de uma revolução cultural,
um choque a mais para nós
nessa soberania estatal.

Se ao menos por uma vez
você se desligasse para me escutar,
se ao menos tentasse pensar,
talvez encontraria alguém para te censurar.

Há pessoas tentando mudar,
tentando mudar seu jeito de ser,
há pessoas tentando encontrar
um meio de fazer você parar
com discussões sem sentido,
agressões servindo de abrigo
para uma insegurança qualquer
dentro só, só de você.

Se ao menos por uma vez
você deixasse eu decir meu modo de agir,
se ao menos tentasse crescer,
talvez encontraria algo em comum para omitir.

1990

Escolas


Tantas são as escolas, tanto a aprender
e a nossa ilusão de um dia tudo saber.

Quantas são as discórdias, quão grande é o prazer
de estar nesse jogo e nada poder fazer.

Sempre seguir...
Homens cansados, sonhos por realizar
que em nossas imagens se encontram
e sentem poder prosseguir,
mas são condenados por um tempo que passou
e sabem que um dia vão ter de partir.

Dessas lembranças um sonho é o que vai surgir.

Distâncias


Marco as distâncias,
sinto no ar repulsão;
tantas lembranças
me dão forças pra recomeçar.

Eu nao vou mais lutar,
sei que o seu brilho não está mais no ar;
quer te ver sumir,
eu tenho forças pra te consumir.

São crentes por tradição,
são indigentes por destinação,
se perdem, se esquecem
buscando o poder
e se materializam por ser
uma imagem de alguém que se foi
pra nunca mais voltar.

Marco as distâncias,
nao vejo mais razões pra culpar
nossas crianças
pela fraqueza de nossos pais.

São crentes por tradição,
são indigentes, são nossos irmãos,
se perdem, se esquecem, tentando entender
e se marginalizam por ser
uma imagem de alguém que se foi
pra nunca mais voltar.

1990

Notícias Urgentes


Focos de radiação por todo o país;
Povos marcados,
heróis exilados,
revoltas civis;
Vão descobrir que podem crescer
sem leis pra seguir,
vão se iludir com reis
que não tardarão a surgir.

Chegam notícias urgentes pra nos preparar,
clamam por nós, penitentes do erro
que vai, vai nos assolar
vão se lembrar
que não há motivos pra preocupações,
vão respaldar as perdas
em más construções.

Sentimentos dilacerados
por jovens fardados,
cheios de precauções,
e os versos sagrados
com tantas contradições;
pensamentos encarcerados nas faces;
nos olhos, aos gritos, as reações.

Falsas lembranças em nossas tantas recordações!
Feito crianças perdidas
num mundo de imagens e simulações,
sem perceber (por quanto?),
tantos passarão sem nada sofrer
sem merecer o que vão receber de nós.

Certos de si, nos induzem decretos;
discretos, procuram saber onde estão;
Cegos, sentimos estar naufragando
e eles juram, juram proteção;
pra nos punir,desandam vazios
a se completar,
sem decidir
a hora de parar.

1988

Grades


No interior de uma vitrine mórbida,
a mente perde a lógica
no contato com o concreto
e mente contando dias
que nao passam de séculos.

Definindo sobrevivência
como a arte de resistir,
são todos artistas
brigando pela posse egoísta
de um pedaço torto de giz,
para calcular a densidade do aço
e a sensualidade dos traços
do corpo da mulher que não está ali,
revolucionários da estética,
tranformando ferida em cicatriz,
encarando a rotina bélica
de escapar da morte por um triz,
sonhando com a forma geométrica
que o sol assumirá
quando voltar a brilhar
em algum lugar do país.

1989

Sobre a condição humana


Na ponte amena
do coração travesso,
dá-se o tropeço da densa poesia
na fronteira fria
do amor pretenso.

Sem pulso forte,
o impulso sofre,
sem êxito, hesita
e abandonado, sente
nos olhos o calor
de uma lágrima ausente.

E o próximo passo,
se faz inseguro:
há um retalho rasgado
sobre um talho profundo,
um grito estendido
ao dia-a-dia noturno,
um gesto suicida
no sonho frustrado,
uma falta preferida
ao suplente marcado,
uma dívida crescente
no presente a ser pago,
um instante definido
por momento mágico
e o início difícil
de um desfecho trágico.

E o último fracasso
que o destino traça,
não tem entrada,
não tem saída,
é a linha de chegada
e o ponto de partida.
1990

AI-5


Sempre voltam eles
com notícias de novas execuções;
sangue novo escorre,
tanta gente some
em meio a essas rebeliões!

Novas caras no poder,
atos institucionais que nos fazem crer
num futuro incerto e atroz,
num passado apagado
de nossas novas gerações
(manchas ocultas em nossas mortalhas).

Vão para fora buscando o poder,
voltam com escolas de guerra para nos abater
e não contentes com a situação,
fazem da tortura a mais nova instituição,
dando início ao que vão chamar de nação.

1988